A pomba da paz e o colibri da guerra – 30/11/2024 – Ricardo Araújo Pereira
Emily Dickinson e Robert Frost escreveram famosos poemas sobre o beija-flor. Pablo Neruda também. Chamou-lhe “mínimo relâmpago vivo” e “minúscula bandeira voadora”. Tobias Barreto interessou-se igualmente pelo passarinho, que imaginou a tentar beijar obstinadamente uma moça, cujos lábios rubros tomou por uma flor.
As aves tinham enorme tendência para esse tipo de confusão, durante o romantismo. Depois foram aderindo a outros movimentos estéticos e deixaram de ver rosas em beiços com a mesma frequência. Mas o beija-flor continuou a encantar poetas. E, agora, encanta também os espíritos mais científicos.
De acordo com uma notícia do jornal americano New York Times, cientistas estudam o voo do beija-flor com o objetivo de projetar robôs para a guerra de drones. Parece que os movimentos do beija-flor, se devidamente copiados, contribuiriam para produzir uma máquina de guerra muito competente e eficaz.
Com uma sensibilidade diferente da dos poetas, os cientistas também se dedicaram a contemplar o lindo voo do beija-flor, também registraram a sua agilidade e leveza, e concluíram que estas milagrosas características dariam muito jeito no âmbito de uma chacina.
Reproduzindo esta forma de voar, conseguiremos conceber uma máquina que ataca como um mínimo relâmpago vivo, transportando para território inimigo a minúscula bandeira voadora do nosso país.
Creio que há uma lição para tirar daqui. A cada um, sua sensibilidade. Uns olham para o colibri e imaginam-se a morrer de amor, outros olham para o mesmo colibri e imaginam o inimigo a morrer de pavor.
Creio que descobri uma atividade parecida e igualmente proveitosa. Examinar colibris para criar máquinas de guerra é como estudar os poemas de amor do Vinicius de Moraes para melhor insultar o árbitro no próximo jogo da seleção. É o que vou fazer.
Em tudo se encontra beleza, é certo —mas, havendo sensibilidade, também em tudo se encontra vileza. Curiosamente, é o meu forte. Contem comigo para encontrar vileza.
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