Leibniz e a matemática do ‘I Ching’ – 26/11/2024 – Marcelo Viana
Escreveu sobre temas como música, filologia, jogos, história, direito, política, ética, teologia e filosofia. Deu importantes contribuições à física, à tecnologia e à biblioteconomia. Introduziu diversas noções fundamentais da ciência da computação, linguística, psicologia, geologia, medicina, biologia e teoria da probabilidade. Matemático, filósofo, cientista, inventor e diplomata, o alemão Gottfried Wilhelm von Leibniz (1646–1716) já foi chamado de “o último gênio universal”.
Leibniz ocupa lugar de destaque tanto na história da filosofia, em que liderou a corrente racionalista e idealista, quanto na história da matemática, na qual é conhecido, sobretudo, como codescobridor do cálculo infinitesimal, juntamente com Isaac Newton (1643–1727). Mas o desenvolvimento do sistema binário de numeração, explanado na obra “Explicação da Aritmética Binária”, que publicou em 1703, também lhe granjeou o título de “primeiro cientista da computação”.
No sistema binário (ou de base 2), todo número é representado usando apenas dois dígitos, 0 e 1. E a tabuada não poderia ser mais simples: 0x0=0x1=1×0=0 e 1×1=1. Por isso, todos os computadores eletrônicos usam o sistema binário.
Um fato menos conhecido é que Leibniz foi também um dos primeiros intelectuais europeus a se interessar pelas culturas de outros continentes, especialmente pela notável civilização da China. Ele a descobriu por meio da correspondência com missionários jesuítas como Joachim Bouvet (1656–1730), matemático e membro da Academia Francesa de Ciências, que lhe propiciou o acesso a diversos manuscritos chineses.
Alguns desses tratavam dos sistemas filosóficos desenvolvidos na China, como o taoísmo e o confucionismo. Leibniz foi um dos primeiros leitores de “Confúcio, Filósofo dos Chineses”, publicado em 1687 pelo jesuíta Philippe Couplet (1623–1693), e buscou compatibilizar o confucionismo com a filosofia europeia. Foi também nesses manuscritos que conheceu o “I Ching” (“Livro das Mutações”), o fascinante manual de adivinhação que remonta ao século 10 a.C. e é, certamente, o mais famoso de todos os livros chineses.
No “I Ching” certos conceitos fundamentais são representados por meio de figuras formadas por três linhas (trigramas), cada uma das quais pode ser quebrada (“yin”) ou contínua (“yang”). Existem trigramas, que correspondem aos conceitos céu, terra, trovão, água, montanha, vento, fogo e lago. Combinando dois quaisquer deles podemos formar os 64 hexagramas, figuras compostas por seis linhas, quebradas ou contínuas, que representam ainda mais conceitos: por exemplo, o hexagrama 35 representa o progresso.
Leibniz percebeu a analogia com o sistema binário, com yin e yang no lugar dos dígitos 0 e 1, que considerou prova cabal do avanço do pensamento chinês. Ele também via no sistema binário uma representação da Criação, com 1 como símbolo da divindade e 0 representando o vácuo. Transmitiu essas ideias ao imperador da China, esperando convencê-lo a se converter ao cristianismo, mas nisso não foi bem-sucedido.
Apesar de todas as suas realizações, Leibniz nunca foi reconhecido como merecia e morreu sozinho e esquecido. A sua sepultura nem sequer foi marcada e teve de ser redescoberta mais de meio século depois.
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