Quem cuida das mães do agora? – 15/10/2024 – Joanna Moura
Às 2:30 da manhã ouvi uma voz aguda invocar do outro quarto: “mamãaaaaae”. Levantei atordoada, tateando no escuro, me esforçando para não maltratar a canela na quina da leito uma vez que já fiz tantas vezes, enquanto a voz seguia chamando.
Cheguei no quarto ao lado e tentei acalmar a párvulo que gritava. “Chiiiiii, chiiiiiii, mamãe tá cá, mamãe tá cá”, repeti baixinho enquanto carregava o menor em direção à porta, num iludido esforço de não estipular a maior que dormia na leito ao lado. Em vão. Antes de colocar a mão na maçaneta, vejo sua cabeça levantar do travesseiro e, percebendo que estava prestes a ser deixada sozinha, ela pede para ir conosco para o outro quarto.
Dormi um totalidade de cinco horas essa noite. A noite anterior tinha sido das boas: seis horas com unicamente uma interrupção.
Tem sido assim nos últimos 15 dias, uma rotina intensa de maternidade solo temporária enquanto o pai das crianças viaja a trabalho. Não que a intensidade seja muito menor quando estamos ambos cá, mas pelo menos a equação mansão + trabalho + crianças é dividida por dois.
A verdade é que faz cinco anos que estou exausta. Para além do cansaço físico e mental, também faz cinco anos que não faço exercícios físicos e sinto dores no pescoço e nas costas dia sim, dia também e que cuido da alimento das crianças e não da minha. Cinco anos que afetaram minha autoestima física e profissional. Cinco anos de gastos exorbitantes com creche, fralda, comida, leite em pó, roupas e com apetrechos que me disseram que eram indispensáveis, mas sem os quais eu poderia definitivamente ter vivido.
Não é à toa que uma recente pesquisa mostrou que nove em mansão dez mães no Brasil sofrem com o “burnout parental”, termo comumente usado para se referir ao esgotamento no envolvente de trabalho, mas que pode também sobrevir devido às pressões e à sobrecarga da parentalidade.
A pesquisa mostrou ainda o óbvio ululante: que mulheres indígenas, pardas e negras, assim uma vez que aquelas com menos escolaridade, mães solo e mães atípicas são os subgrupos que mais sofrem.
Em generalidade todas essas mães desabando experimentam a falta de pedestal. Algumas mais que outras. Num mundo cada vez mais individualista e depressa, a noção da tal “vila” que contribuiria para a geração dessas crianças foi para o brejo. E se não tem vila, quem tem verba contrata babá e folguista, e quem não tem, tenta sobreviver a essa conta de soma de funções que simplesmente não fecha.
Outro dia, me deparei com uma entrevista com a Paula Burlamaqui. Perguntada sobre uma vez que está encarando o processo de envelhecer, a atriz de 57 anos respondeu: “Eu fico apavorada. Fico pensando: quem é que vai cuidar de mim? Se eu tiver uma demência? Alguma incapacidade, quem vai cuidar de mim? Se eu pudesse voltar no tempo, eu teria um rebento só para prometer um bem-estar na minha vetustez”.
Entendo a preocupação de Paula, mormente num país cuja pressão para reproduzir é enorme ao mesmo tempo que o descuramento aos idosos é uma veras tão flagrante. Mas a pergunta que ecoa em mim é outra, voltada para as mães do presente: quem é que cuida de nós no agora? E se o desvelo com os outros não permite que cuidemos de nós mesmas hoje, o que será de nós amanhã?
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