Rainha da Sucata faz a alegria dos noveleiros no Globoplay – 12/10/2024 – Thiago Stivaletti
Nos últimos anos, os noveleiros se faziam a mesma pergunta nas redes: por onde anda “Rainha da Sucata” (1990), que ainda não entrou no Globoplay? A plataforma lançou “Guerra dos Sexos” (1983), “Vale Tudo” (1988), “Tieta” (1989) e “Que Rei Sou Eu?” (1989), mas zero de a sucateira chegar. A espera acabou nesta semana, e os fãs já podem rever inteirinha a primeira romance das oito de Silvio de Abreu.
A romance reúne um elenco que a Orbe nunca mais vai ver na vida: Regina Duarte em seu auge, Glória Menezes, Tony Ramos, Claudia Raia, Antonio Fagundes, Renata Sorrah, Aracy Balabanian, Raul Cortez, Paulo Gracindo e por aí vai.
Só para se ter uma teoria do poder da emissora, as participações especiais do primeiro capítulo são “unicamente” Fernanda Montenegro, Lima Duarte, Marília Pêra e Stênio Garcia. Só a curso desses quatro já vale mais que o elenco inteiro de “Mania de Você”.
Eu tinha 12 anos e morava em Santos. Às vezes, vínhamos de coche para São Paulo. Sempre que entrávamos na avenida Paulista e passávamos em frente ao prédio da Caixa Econômica, quase em frente ao Conjunto Vernáculo, meu pai, ao volante, dizia: “Sabia que foi desse prédio que a Laurinha se jogou?”.
Era uma reinação repetida que sempre me fazia rir. E porquê olvidar da Glória Menezes, de vestido branco esvoaçante, se jogando do supino de um prédio depois de arrancar um brinco da ouvido da sucateira?
Dá muita saudade ver que, nos anos 1990, um diretor porquê Jorge Fernando se permitia milénio loucuras. Hoje, o flashback do primeiro capítulo, que mostra o dança de formatura de Maria do Carmo (Regina Duarte) e Edu (Tony Ramos), em que ela toma um banho de vasa num bullying estudantil armado por ele, seria feito com atores jovens.
Mas não: o diretor coloca Regina e Tony com um cabelo ridículo fazendo os seus personagens aos QUINZE anos. É quase uma reinação de teatro, que hoje tomaria muita paulada no X no dia da estreia.
Uma gueixa muito louca
Maria do Carmo foi um dos grandes personagens de Regina na Orbe, da era em que ela era uma grande atriz —se pudesse, eu teria reservado esse banho de vasa para quando ela virou ministra da Cultura do Bolsonaro.
Suas roupas exóticas beiravam a desorganização —num dia ela estava com um chapéu triangular de gueixa japonesa, no outro com um vestido de laçarote imenso no ombro que quase fazia a Regina ser engolida no meio dele.
Sem falar naquela mesa de trabalho incrível, com a secção da frente de um Chevrolet 1958. Poder, luxo, riqueza e cafonice, tudo junto ao mesmo tempo.
Era secção do clima de chanchada da romance, para retratar essa empresária emergente e cafona que bota no bolso os ricos decadentes da família Figueroa: Edu, a vilã Laurinha e o mimado Betinho (Paulo Gracindo), aquele que sempre falava “coisas de Laurinha!”.
Romance é uma grande corrida de cavalos, em que até o responsável aposta em alguns personagens para prefulgurar, mas outros sempre podem surpreender. A rivalidade entre a emergente Maria do Carmo e a falida Laurinha era o grande motor de “Rainha da Sucata”, mas eis que de repente uma vizinha escandalosa roubou a cena.
Dona Armênia (Aracy Balabanian) amava “seu três filhinhas”, morria de inveja dos três e cresceu tanto na romance que quase botou “a prédio dessa sucateira na chón!”. Fez tanto sucesso que Silvio de Abreu trouxe ela de volta em sua romance seguinte, “Deus nos Acuda” (1992).
E olha que a romance pegou uma concorrência que a Orbe não esperava. Menos de uma semana antes, a Manchete estreava “Pantanal”, a romance mais muito sucedida de toda a sua história. Para tombar a rival, a Orbe esticava a história da sucateira para que Juma Marruá entrasse cada vez mais tarde.
E foi ali, em 1990, que a Orbe extinguiu um paixão dos noveleiros: as cenas do próximo capítulo. A estratégia era principiar logo o programa seguinte para que o público não migrasse para “Pantanal”. No final, ambas se deram muito, e todo mundo se apaixonou pelas duas.
O verdadeiro dilema era admitir qualquer invitação para trespassar de lar; valia mais a pena ver a volta por cima da sucateira e a paixão da mulher-onça pelo moço da cidade grande.
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